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Parashat Ki Tissá

A diversa e abrangente parashat Ki Tissá começa com a ordem de D'us a Moshê para fazer um recenseamento, coletando uma contribuição igual de uma moeda de meio-shêkel de cada adulto do sexo masculino entre as idades de 20 e 60, e estes lucros irão para o Mishcan (Tabernáculo).

D'us descreve a Moshê o kiyor de cobre (lavatório e base) na qual os Cohanim santificarão suas mãos e pés antes de servirem no Mishcan. É também discutido o azeite para unção que seria usado para santificar os vários utensílios para uso normal. A isso segue-se a receita para o ketoret, insenso aromático a ser queimado duas vezes ao dia. D'us designa Betsalel, da tribo de Yehudá, e Oholiyav, da tribo de Dan, a supervisionar a construção do Mishcan que está para ser iniciada. A mitsvá do Shabat é então repetida para advertir a nação de que mesmo a construção do Mishcan não suplanta a observância do dia semanal de descanso.

A Torá retorna à narrativa da Revelação no Monte Sinai, e descreve o terrível pecado do bezerro de ouro. D'us acede às preces de Moshê para que os filhos de Israel sejam poupados da aniquilação por sua grave transgressão, e Moshê desce da montanha com as duas Tábuas dos Dez Mandamentos.

Ao testemunhar uma parcela da população dançando ao redor do Bezerro de Ouro, Moshê quebra as Tábuas e queima o ídolo, iniciando o processo de arrependimento. Como resultado da queda do povo de seu patamar espiritual elevado, D'us anuncia que Sua presença não pode residir entre eles.

Moshê é forçado a mudar temporariamente a tenda para fora do acampamento, para que D'us continue a se comunicar com ele. Moshê novamente sobe à montanha para rezar a D'us para que perdoe o povo judeu, e lhes devolva o status de povo escolhido. Moshê finalmente retorna com o segundo conjunto de tábuas e um pacto renovado com D'us; sua face aparece resplandecente como resultado da revelação Divina.

Êxodo 30:11-34:35

Parashat Bô

D’us fala para Moshê e Aharon irem até o faraó para que este liberte o povo judeu da escravidão, e se assim não o fizer, D’us castigará o Egito enviando a 8a. praga, gafanhotos, que cobrirá toda a terra e acabará com todo alimento e plantações que restaram, após a praga de granizo.

Ao saber que Moshê pretendia levar todo o povo judeu, homens, mulheres, criancas e todo o seu gado, o faraó não permitiu que todos partissem, mas apenas os homens. O faraó volta as costas para Moshê e Aharon e então D’us manda os gafanhotos, dando início a destruição. A praga só é interrompida quando o faraó novamente implora a Moshê que reze a D’us para que interrompa a praga. Mas logo em seguida, assim que desapareceram os gafanhotos, endureceu novamente seu coração não deixando os judeus partirem. D’us então envia a 9a. praga: a escuridão completa. As trevas só afetavam os egipcios que permaneciam no mesmo lugar, sentados ou em pé, sem poder se mover por três dias, e somente para os judeus havia luz.O faraó apela novamente para Moshê, mas permite que partam desde que deixem seu gado para trás. Moshê não concorda, pois o gado servirá de oferta de sacrifícios para D’us. O faraó então não os deixa partir.

D’us envia a última praga ao Egito: morte aos primogênitos. D’us instruiu Moshê e Aharon sobre o mês de Nissan que será para o povo judeu o primeiro dos meses do ano e todos os detalhes envolvendo o Cordeiro Pascal, que seriam preparados para a refeição que precede o Êxodo. O sangue dos cordeiros foi colocado como sinal nas casas dos judeus para que D’us "saltasse" sobre suas casas, ferindo somente os egípcios.

D’us estabelece a comemoração de Pêssach e a proibição de ingerirmos alimentos fermentados. Também nos instrui, através de Moshê e Aharon, sobre a obrigação de todos os anos, nesta data, relatarmos o Êxodo do Egito e os milagres com que Ele nos libertou da escravidão a nossos filhos, em todas as gerações. A parsha termina estabelecendo a mitsvá de Pidyon Haben (Resgate do Primogênito) e da colocação de tefilin.

Êxodo 10:1-13:16

Parashat Vayetsê

Vayetsê começa com Yaacov fugindo de Esav e deixando a casa dos pais para viajar a Charan, onde ficará com seu tio Lavan (Labão). Ao passar a noite no local onde no futuro seria construido o Templo Sagrado, D'us aparece a Yaacov no sonho de uma escada descendo do céu até a terra, na qual anjos sobem e descem. Do topo da escada, D'us promete a Yaacov que seus descendentes herdarão a Terra de Israel.

Na sua chegada em Charan, após rolar uma imensa pedra da boca do poço da cidade para que os pastores do lugar pudessem dar água aos rebanhos, Yaacov encontra a filha de Lavan, Rachel, e concorda em trabalhar para seu pai por sete anos a fim de conseguir sua mão em casamento. Quando finalmente chega a noite do casamento, Lavan engana Yaacov, substituindo Rachel pela sua filha mais velha, Lea. Após esperar uma semana, Yaacov casa-se também com Rachel, mas não antes de ser forçado a cumprir mais sete anos de trabalho.

Nos anos que se seguem Rachel permanece estéril, enquanto Lea dá à luz a seis filhos e uma filha, e Bilá e Zilpá (as criadas de Rachel e Lea, respectivamente) cada uma tem dois filhos de Yaacov.

Finalmente Rachel tem um filho, Yossef. Yaacov torna-se muito rico durante sua estadia com Lavan, amealhando um grande rebanho, mesmo enquanto Lavan continuamente tenta enganá-lo por todos os vinte anos de sua permanência.

Após aconselhar-se com suas esposas, Yaacov e a família fogem de Lavan, que o persegue e o enfrenta, aborrecido por Yaacov ter ido embora sem se despedir, e arrogantemente afirmando que Yaacov roubou seus ídolos.

Após Lavan infrutiferamente procurar os ídolos (que Rachel escondeu, sem que Yaacov soubesse, para impedir o pai de adorá-los), Yaacov e Lavan entram em uma acalorada discussão. Finalmente assinam um acordo, prometendo permanecer em paz, e a porção se encerra quando eles se separam.

Gênesis 28:10-32:3

Parashat Toledot

Yitschac casa-se com Rivca. Após vinte anos sem filhos, suas preces são atendidas e Rivca concebe. Ela passa por uma gravidez difícil, pois “as crianças lutam dentro dela”; D’us diz a Rivca que “há duas nações em seu ventre,” e a mais jovem prevalecerá sobre a mais velha.

Essav emerge primeiro; Yaacov nasce agarrado ao calcanhar de Essav. Este cresce para ser um “exímio caçador, um homem do campo”; Yaacov é um “homem íntegro”, que habita as tendas de estudo. Yitschac favorece Essav; Rivca ama Yaacov. Voltando exausto e faminto de uma caçada certo dia, Essav vende seu direito de primogenitura a Yaacov por um prato de lentilhas.

Em Gerar, na terra dos filisteus, Yitschac apresenta Rivca como sua irmã, por medo de ser morto por alguém que cobice a beleza dela. Ele cultiva a terra, reabre os poços cavados por seu pai Avraham, e abre uma série de poços próprios: sobre os primeiros dois há conflitos com os filisteus, porém as águas do terceiro poço são desfrutadas com tranqüilidade.

Essav casa-se com duas mulheres hititas. Yitschac fica velho e cego, e expressa seu desejo de abençoar Essav antes de morrer. Enquanto Essav sai para caçar o alimento preferido do pai, Rivca veste Yaacov com as roupas de Essav, cobre seus braços e pescoço com pele de cabra para simular o toque de seu irmão mais peludo, prepara um prato saboroso de lentilhas, e envia Yaacov ao pai.

Yaacov deixa o lar e vai para Charan para fugir da ira de Essav e para encontrar uma esposa na família do irmão de sua mãe, Laban. Essav toma uma terceira esposa, Machlat, filha de Ishmael.

Gênesis 25:19-28:9

Parashat Vayerá

Avraham e o Guisheft com Deus

 

Deus é chamado no Judaísmo por vários nomes. Alguns desses nomes lhe foram dados pelos rabinos e pelos sábios de nosso povo. Outros nomes aparecem na Torá Escrita, são dez ao todo, esses dez nomes não podem ser apagados nem destruídos, aí está a razão para serem enterrados os sifei Torá, tefilin e sidurim velhos: como eles trazem os nomes Divinos escritos neles não podem ser jogados fora ou simplesmente descartados e destruídos.

 

Um dos nomes divinos que aparecem no texto da Torá é Elohim. Esse nome é na guemátria, a numerologia hebraica, igual à palavra hateva, a Natureza. Esse nome está portanto, relacionado à manifestação imanente de Deus através das forças naturais. Sabemos pela experiência que as forças naturais podem ser altamente benéficas, como por exemplo, a luz solar sendo absorvida por nossos corpos ou por uma planta num dia de verão, ou a força das águas de um rio ou do vento sendo utilizadas pelos homens para produzir energia elétrica. Mas as forças naturais também podem ser destrutivas, pois, a mesma luz solar pode nos queimar e os ventos e águas dos rios podem destruir cidades inteiras. O fato é que apesar de nossas ilusões modernas de que podemos controlar as forças naturais, frequentemente a natureza se mostra grandiosa demais para se submeter aos nossos caprichos.

 

Quando ouvimos falar de catástrofes naturais, como tsunamis, enchentes e terremotos, e ficamos atônitos. Tanta gente morta, tantas vidas destruídas, pessoas que num dia estavam bem e no outro perderam tudo. No meio de uma catástrofe natural tanto os bons quanto maus são engolfados sem poder também escapar. Tudo isso dito assim é tão simples, tão obvio. Nem sequer questionamos esses fatos da vida. O sofrimento visto pela tela da televisão é distante, apesar de nos emocionarmos, no minuto seguinte estamos imersos em outros interesses.

 

Na parashá da Torá desta semana, Vaierá, uma coisa dessas acontece com Avraham. A narrativa conta que Deus, por meio de um anjo, lhe avisa da iminente destruição de Sodoma e Gomorra. Essas duas cidades até hoje são sinônimos de sociedades injustas e corruptas, lugar onde não mora gente de bem. Se Deus nos avisasse que ambas essas cidades seriam destruídas, talvez alguns de nós apoiassem como natural ou até mesmo bem feito para eles. Mas não foi assim que Avraham pensou. Avraham ficou indignado com Deus! Como poderia o Juiz de toda a terra não fazer justiça! Destruir as cidades sem pelo menos separar os justos dos corruptos? Mas como separar os justos dos corruptos? Avraham começa então um insólito guisheft com Deus. Se existisse um número mínimo de inocentes, ainda que fossem somente cinqüenta, ou quarenta, ou trinta, ou vinte nessas cidades isso justificaria não apenas que eles fossem poupados da calamidade, mas que toda a população dessas cidades fosse poupada junto com eles. Existisse na época algo como uma equipe de resgate, certamente Avraham teria descido até lá para salvar os sobreviventes, pois, uma vida ao menos que fosse salva já seria muito preciosa. O importante é que Avraham não ficou parado e deu de ombros.

 

Nós os filhos de Avraham, quatro mil anos depois, não precisamos nos preocupar apenas com as calamidades que acontecem em outros cantos do mundo. Aqui mesmo em nosso país, em nossa área urbana muitas vidas estão clamando por socorro. É a violência, é o desemprego é a desilusão. Pode ser que não sejam todos tzadikim, mas são homens, mulheres, velhos e crianças. Gente, e só por isso suas vidas são preciosas. Tão preciosas quanto as vidas daqueles tzadikim dos tempos de Avraham. Fazer o guisheft com Deus é não ficar parado, vendo tantos horrores pela TV e achando que tudo isso é natural. Pode até ser natural como a seca no Nordeste, mas a Torá nos ensina e espera de nós outra atitude, como filhos e filhas de Avraham.

 

Shabat Shalom,

 

Alexandre Leone

Gênesis 18:1-22:24

Parashat Lech Lechá

Abraão – Parashá Lekh Lekhá

Abraão, hoje a lenda em torno de seu nome e os símbolos que ele evoca são muito maiores do que a base histórica das narrativas sobre ele. Seu nome evoca sobre tudo a solidariedade, a retidão e a compaixão. Para Abraão é feita a promessa de que por meio dele seriam abençoadas todas as famílias da Terra. Com ele é feita a Aliança. É ele quem desafia Deus a fazer justiça e não permitir o sofrimento dos inocentes. Acerca dele nossa tradição conta que sua tenda estava aberta em todas as direções para melhor receber a todos com sua hospitalidade. O fundo histórico das narrativas da Torá sobre o período dos patriarcas é o Oriente Médio durante o segundo milênio antes da Era Comum, quando naquela região grandes civilizações surgiam em torno dos rios Tigre, Eufrates e Nilo e diante do Mediterrâneo. Há forte semelhança entre os hebreus bíblicos e as tribos seminômades de pastores chamados nos textos da época de hapiru tanto por egípcios quanto pelos fenícios. Essas tribos e clãs se espalhavam desde a Mesopotâmia até o Egito. Abraão é retratado nas narrativas como o chefe de um clã, mas não é neste detalhe onde reside seu carisma e sim no fato de o grupo abrâmico ter tomado um caminho singular que os levou ao monoteísmo-ético que é o maior legado da mensagem de Abraão. Levinas entende essa mensagem como significando que somente através da ética a pessoa pode se achegar a Deus, “a ética é uma ótica”.

A caminhada iniciada por Abraão frutificou, após quase quatro milênios, nas diversas tradições e comunidades religiosas que dele descenderam de modo direto ou indireto. O judaísmo, assim como o cristianismo, o islã, os samaritanos, os drusos, os bahais e até mesmo os sikhs da Índia se originaram de ramos diferentes do monoteísmo abramaico. Desse modo, o nosso Avraham Avinu é também Abraão e Ibrahim no imaginário daquelas tradições. Na tradição judaica começamos a Amidá, nossa principal oração, recitada de pé, três fezes ao dia, com as palavras “Deus de Abraão, Isaac e Jacó”.

Segundo Heschel, essa expressão não deveria ser entendida como “o Deus da verdade, bondade e beleza”. Abraão, Isaac e Jacó não significam ideias, princípios ou valores básicos. Nem devem ser tomados como professores ou pensadores e assim a expressão não deveria ser considerada equivalente a “Deus de Kant, Hegel e Schelling”. Abraão, Isaac e Jacó não são conceitos abstratos que devam ser compreendidos, mas princípios ativos a serem continuados. A vida daquele que se associa ao Pacto de Abraão dá continuidade à vida de Abraão. Pois, o presente não permanece à parte do passado. “Abraão ainda permanece diante de Deus” (Gên. 18:22). “Nós somos Abraão, Isaac e Jacó”.

Shabat Shalom,

 

Rabino Alexandre Leone

A Parashá Lech Lechá inicia-se com o chamado de D'us a Avraham, para que deixasse sua terra de origem e a casa de seu pai, sua posição de status e prosperidade, e viajasse à terra que Ele lhe mostraria.

Na chegada, com sua esposa Sarah e o sobrinho Lot, na terra de Israel, eles descobrem que a terra foi assolada por uma terrível escassez e por esta razão vão ao Egito para uma breve estadia. Os egípcios imediatamente capturam Sarah, a quem Avraham havia identificado como sua irmã, e a levam ao Rei Egípcio.

D'us reage afligindo o rei e sua família com uma peste debilitante até que a liberte, quando então eles retornam à terra de Israel. Os pastores de Avraham e Lot começaram a brigar e os dois decidem se separar, com Lot escolhendo as férteis planícies de Sodoma como sua porção.

A Torah então descreve a guerra infame entre os quatro reis e os cinco reis, durante a qual Lot é feito prisioneiro. A reação de Avraham o faz derrotar miraculosamente os quatro reis previamente vitoriosos e salvar seu sobrinho e se recusa a ficar com as honrarias ou os despojos de guerra para si.

D'us reafirma a Avraham que Ele está a seu lado, e promete que seus descendentes serão tantos que serão incontáveis como as estrelas no céu. O Criador então entra na simbólica Aliança Entre as Partes, com Avraham, prometendo que seus filhos herdarão a terra de Israel, mas não antes de serem exilados numa longa servidão.

Como não tem filhos, Sara dá sua serva Hagar a Avraham como esposa, e nasce seu filho Ishmael. Avraham tinha 86 anos. Treze anos depois, D'us muda o nome de Avram (Abrão) para Avraham (“pai das multidões”), e o de Sarai para Sarah (“princesa”).

D’us promete que um filho nascerá para eles; a partir dessa criança, que eles deverão chamar de Yitschac (“dará risada”), brotará uma grande nação com a qual D’us estabelecerá um vínculo especial. Abraham é ordenado a circuncidar a si mesmo e aos seus descendentes como um “sinal do pacto entre Mim e vocês.”, aos 99 anos.

Gênesis 12:1-17:27

Parashat Nôach

A porção da Torah desta semana chama-se Nôach. Este homem é o único justo em seu tempo, um mundo consumido pela violência e corrupção. D'us o ordena a construir uma grande arca, uma espécie de barco, de madeira revestida por dentro e por fora com breu. “Um grande dilúvio”, diz D’us, “vai dizimar a vida da face da terra; porém a arca flutuará, à deriva, sobre a água, abrigando Nôach e sua família, além de dois membros (macho e fêmea) de cada espécie animal.”

A chuva durou 40 dias e 40 noites, e as águas agitaram-se por mais 150 dias antes de acalmarem-se e começarem a baixar. A arca pousou sobre o Monte Ararat, onde hoje é a Turquia, e de sua janela Nôach despachou um corvo, e depois uma série de pombos “para ver se as águas abaixaram da face da terra.” Quando o solo secou completamente. Em exatos 365 dias do início do Dilúvio. D’us ordenou a Nôach que saisse da teivah, arca, para repovoar a terra.

Nôach construiu um altar e ofereceu sacrifícios a D’us, que prometeu jamais destruir novamente a humanidade por causa de suas ações, neste momento aparece o arco-íris, que será como testemunha de Seu novo pacto com o homem. D’us também ordenou a Nôach para considerar a vida sagrada: o assassinato é considerado uma ofensa capital, e embora o homem tenha permissão de comer carne dos animais, está proibido de comer carne ou sangue tirado de um animal vivo ou causar-lhe qualquer tipo de sofrimento.

Nôach plantou uma vinha e ficou embriagado ao consumir  o fruto de sua produção. Dois de seus filhos, Shem e Yafet, são abençoados por cobrir a nudez do pai, ao passo que seu terceiro filho, Ham, é amaldiçoado por tirar vantagem de sua degradação.

Os descendentes de Nôach permaneceram um único povo, com uma só língua e cultura, durante dez gerações. Então desafiaram o Criador, construindo uma grande torre para simbolizar a própria invencibilidade; D’us confunde sua linguagem para que “um não compreenda a língua do outro,” fazendo com que abandonem seu projeto e se dispersem pela face da terra, dividindo-se em setenta nações.

A Parashá conclui com uma cronologia das dez gerações de Nôach a Abrão (mais tarde Avraham), e a jornada deste do seu local de nascimento, Ur Casdim, para Haran, a caminho da Terra de Canaã.

Gênesis 6:9-11:32

Parashah Bereshit

A Parashah Bereshit, a primeira porção da Torah, começa com a criação do mundo por D'us em seis dias e Seu "descanso" no sétimo.

No primeiro dia Ele fez luz e trevas. No segundo dia Ele faz os céus, dividindo as "águas superiores" das "águas inferiores". No terceiro dia Ele define os limites da terra e do mar, e convida diante da terra árvores e vegetação. No quarto dia Ele define a posição do sol, lua e estrelas como marcadores de tempo e iluminadores da terra. Peixes, aves e répteis são criados no quinto dia; animais terrestres , culminando com a criação do homem. D-us forma o corpo humano a partir do pó da terra e sopra em suas narinas uma "alma viva". Originalmente o homem é uma única pessoa, mas decidindo que "não é bom que o homem fique sozinho," D-us tira um "lado" do homem, tramsforma-o em uma mulher, e conjuga-os uns aos outros. Adam (Adão) e da mulher - Chava (Eva) à imagem de D'us e sua colocação no Jardim do Éden no sexto dia, foi criado e arrumado em seu correto lugar nesta primeira semana. Os humanos recebem o domínio sobre o mundo inteiro com apenas uma restrição - abster-se de consumir o fruto da Árvore do Conhecimento. D-us deixa de trabalhar no sétimo dia, e santifica-o como um dia de descanso.

Chava é tentada pela serpente a servir-se do fruto proibido, e oferece-o ao marido também. D'us reage punindo-os pela transgressão, é decretado que o homem irá viver a morte, retornando ao solo de onde ele foi formado, e que todos os ganhos virão somente através de luta e sofrimento. e além disso são banidos do paraíso do Eden.

Após a expulsão, seus dois primeiros filhos, Cain (Caim) e Hevel (Abel) trazem cada um uma oferenda para o Criador. A oferenda superior de Hevel é aceita por D'us, enquanto que a de Cain, inferior, é rejeitada. Cain invejosamente reage matando seu irmão, e D'us o envia ao exílio, condenado a vagar pela face da terra. A Torá então fornece uma genealogia das primeiras dez gerações do mundo, começando com Adam, seu terceiro filho Shet, e chegando até o nascimento de Nôach (Noé) e seus três filhos.

Desgostoso com a perversidade do homem, a porção se encerra com D'us expressando Sua decisão de destruir todos os seres viventes, com exceção do justo Nôach e sua família.

Gênesis 1:1-6:8

Por que comemoramos sucot em tishrei

Aos judeus foi ordenado trocarem suas moradas por Sucot (cabanas) no dia 15 do sétimo mês do calendário judaico, Tishrei, em lembrança às Sucot nas quais D'us os instalou quando saíram do Egito. Entretanto pode-se perguntar: o Êxodo do Egito ocorreu em Nissan; seria, portanto, mais adequado lembrar o evento na sua época original - Nissan. Por que fomos ordenados a observar Sucot em Tishrei? Inúmeras razões foram dadas.

Durante Nissan, mês da primavera em Israel, o clima fica mais quente, usualmente saímos para ficar em cabanas. E é exatamente em Tishrei que as pessoas voltam a ficar em casa devido às chuvas e ao frio das noites. Portanto, quando neste período os judeus residem em tendas, fica claro perante todos que isto está sendo feito para servir a D'us e cumprir Sua vontade, como está escrito: "A fim de que as gerações saibam."

Nossos sábios também responderam à pergunta por que observamos Sucot depois de Yom Kipur: Em Rosh Hashaná D'us julga todos os habitantes do mundo; em Yom Kipur Ele sela o julgamento. E uma vez que possa ter sido decretado que Israel vá ao exílio, erigimos a sucá.

Outras razões foram apontadas pelas autoridades judaicas. Não comemoramos as nuvens de glória que rodearam o povo judeu quando da saída do Egito, uma vez que desapareceram com o pecado do bezerro de ouro. Comemoramos somente as nuvens de glória que retornaram - depois de Yom Kipur - e que continuaram durante os quarenta anos de permanência do povo no deserto.

Depois de Israel ter pecado com o bezerro e do desaparecimento das nuvens de glória, Moshê (Moisés) subiu aos Céus três vezes. Ao descer pela terceira vez, trouxe para Israel a mitsvá de erigir o Mishcan - Tabernáculo, como uma prova de que D'us havia se reconciliado com o povo e a partir de então iria habitar em nosso meio.

Em Yom Kipur, Moshê desceu do monte. No dia seguinte, está escrito: "Moshê reuniu toda a congregação dos filhos de Israel e disse... tomai de vós uma oferenda para D'us." Nos dois dias seguintes - dia 12 e 13 de Tishrei - eles trouxeram suas contribuições. No dia 14 de Tishrei, os artesãos que construíram o Mishcan receberam todas as contribuições de Moshê. No dia 15, começou a construção e, então, as nuvens de glória retornaram e formaram uma sucá - uma cobertura protetora - sobre o acampamento de Israel.

Conseqüentemente, determinou-se que ficássemos em tendas naquele dia. Da mesma maneira que D'us, por assim dizer, deixou os Céus e fez Sua Presença repousar no seio dos filhos de Israel, assim Israel mostra a D'us que também deixam suas casas e permanecem com Ele, numa sucá - na sombra protetora de Sua fé.

Durante os Dias de Reverência, de Rosh Hashaná a Yom Kipur, Israel pede perdão pelos pecados de todo o ano. Mas apesar do arrependimento ser aceito e os pecados perdoados, ainda nos preocupamos com pecados no passado. Normalmente, uma pessoa arrependida se sente como se não pudesse encontrar lugar no mundo. D'us então nos diz: "Desde que não conseguem encontrar um lugar, devido ao seu sentimento de culpa, Eu lhes farei um lugar. Venha a Mim e encontre proteção na Minha sombra - na sucá da Minha paz."

Sucot

Parashat Ki Tavô

A porção desta semana denominada Ki Tavo inicia descrevendo a mitsvá anual aos camponeses para que trouxessem seus bicurim, que são os primeiros frutos, e entregue aos cohanim (sacerdotes) no Beit Hamikdash, quando então os ofertantes reconhecem o importante papel do criador na provisão e no sustento.

Após novamente exortar o povo a permanecer fiel às leis divinas, e compreender que D'us os elegeu especificamente como Seu povo, dentre as nações existentes. Mosheh ensina mais duas mitsvot de caráter muito específico, que eles deverão cumprir ao entrar na Terra de Israel para reafirmar seu compromisso com HaShem. Primeiro deverão escrever todo o Sefer Torah em doze grandes pedras, e então deverão recitar bênçãos e maldições no vale entre Monte Gerizim e Monte Eival, as quais se aplicarão respectivamente àqueles que cumprem e àqueles que afrontam a Torah. Seguindo-se uma recontagem das maravilhosas bênçãos que D’us concederá ao povo judeu por permanecer fiel. Mosheh faz uma assustadora profecia do que se abaterá sobre o povo judeu por não cumprir a Torah. Conhecido como admoestação, Mosheh descreve com detalhes a horrível destruição que infelizmente acontecerá quando nos desviarmos das mitsvot.

Lemos sobre a importância das bênçãos e maldições. Enquanto as bênçãos foram concedidas na montanha de Gerizim, as maldições foram dadas no Monte Ebal. Acontece que as lições que esta porção nos dá, nos leva à pergunta: Como é que podemos conectar com as bênçãos e não as maldições?

Podemos dizer que bênçãos e maldições são os dois lados da mesma moeda. Em qualquer situação há escuridão e há Luz. Por exemplo, todos nós já ouvimos sobre a pessoa que teve sorte ao ganhar a lotaria ou ficar rico repentinamente, mas que com mais dinheiro chegam mais problemas. Por outro lado, famílias onde alguém teve uma doença grave e isso os aproximou, tornou-os mais fortes do que antes. Então a resposta é que não existe nada como uma situação (ou uma pessoa, por esse motivo) que seja toda boa ou toda má. Para tudo existe um pequeno Gerizim e um pequeno Ebal. O que escolhemos conectar depende da nossa consciência.

A Porção da Torah encerra quando Mosheh contempla em retrospecto os maravilhosos milagres que D’us realizou pelos quarenta anos anteriores, lembrando o povo da enorme dívida de gratidão que tem com D’us por Seu carinhoso amor.

Luciano Casalunga

Deuteronômio 26:1-29:8

Parashat Shofetim

A parashah Shofetim fala sobre os mandamentos a respeito da criação de um sistema "político" em Eretz Israel, começando com a designação de cortes, juizes e oficiais em cada cidade. Após esboçar o processo de julgar um idólatra, a Torah ensina que a pena de morte deve ser imposta a qualquer pessoa que pronunciar uma decisão contra o Grande Sanhedrin, que é a Suprema Corte, composta por 71 juizes em Jerusalém, não importa o quanto sejam notáveis os eruditos envolvidos na disputa.

O povo judeu recebe ordens de requisitar um rei assim que estiver instalado em Israel. São relacionados alguns dos presentes especiais que devem ser dados aos cohanim, sacerdotes.
Após descrever a natureza da profecia, a Torah repete as leis do Ir Hamiklat, cidade de refúgio para assassinos, nos casos de homicídio culposo, ou seja sem a vontade de matar.E descreve o caso judiciário especial de Edim Zomemim, testemunhas conspiratórias.

A Torah então fala de vários aspectos da conduta da nação durante a guerra, dizendo-lhes para não temer os inimigos, e relacionando aquelas pessoas que estão isentas do serviço militar. Deve-se primeiro dar ao inimigo a oportunidade de paz, e o povo judeu deve ser cuidadoso para não destruir nenhuma árvore frutífera durante a batalha.

A porção da Torá conclui com o caso do assassinato não resolvido e com o ritual da eglá arufá, a novilha decapitada, que serve como expiação para o povo das cidades vizinhas por não terem impedido o assassinato.

Para mais detalhes compareça em nosso cabalat shabat. 

Luciano Casalunga.

Deuteronômio 16:18-21:9

Parashah Reê

Na Parashat Reê, Moshê continua a exortar o povo judeu a seguir os caminhos da Torá, e a confiar em D’us. Moshê começa a colocar as mitsvot em perspectiva, sem ambigüidade, declarando que o povo judeu será abençoado se cumprir a Torá, e amaldiçoado se não o fizer.

Ele começa então uma longa revisão de várias mitsvot, compreendendo a maior parte do livro Devarim. Primeiro discute alguns dos mandamentos que são relevantes à iminente conquista da Terra de Israel pelo povo, conclamando-os novamente a remover qualquer vestígio de idolatria. Após ensinar-lhes certos detalhes sobre a oferenda e o consumo de corbanot, sacrifícios, a Torá ordena que o povo judeu se abstenha de imitar as nações que os circundam. A eles é dito que permaneçam atentos aos falsos profetas e outras pessoas que poderiam afastá-los de D’us, e aprendem as leis de uma cidade judaica que tornou-se tão corrupta que a maioria de seus cidadãos sucumbiu à idolatria, recebendo por isso a pena de morte.

A Torá faz uma revisão sobre quais animais são casher, permitidos para consumo, e quais não o são, seguida pelas leis de ma’aser sheni – o segundo "dízimo", que é consumido por seus proprietários, mas apenas na cidade de Jerusalém.

Após ordenar que todas as dívidas sejam canceladas ao final de cada sétimo ano (Shemitah), e que devemos ser calorosos e caridosos com nossos irmãos, a Torá repete as leis relativas ao servo judeu. Ele deve ser libertado incondicionalmente no sétimo ano e coberto de presentes generosos por seu antigo amo.

A Parashat Reê conclui com uma breve descrição das três festas de peregrinação – Pêssach, Shavuot e Sucot – quando todos deveriam ir a Jerusalém e ao Templo com oferendas, para celebrar sua prosperidade.

Deuteronômio 11:26-16:17

Parashah Ekev

A porção da semana denominada Ekev começa com Moshê encorajando os filhos de Israel a confiar em D’us e nas maravilhosas recompensas que Ele lhes dará se guardarem a Torah. Moshê assegura-lhes que derrotarão com êxito as nações de Canaã, quando deverão remover todo e qualquer vestígio de idolatria remanescente na Terra Santa.

Moshê os lembra sobre o miraculoso manah e as outras maravilhas com que D’us os cumulou pelos quarenta anos passados, e ele adverte o povo judeu para estar consciente das armadilhas de sua futura prosperidade e orgulho das façanhas militares, o que pode fazê-los esquecer D’us. Ele os relembra ainda de suas transgressões no deserto, recontando toda a história do bezerro de ouro, e descrevendo a abundante misericórdia de D’us.

Moshê enfatiza que a geração do deserto tinha uma responsabilidade especial de permanecer leal às mitsvot, preceitos da Torah, por causa dos muitos milagres que vivenciaram pessoalmente. Após detalhar as numerosas virtudes da Terra Prometida, Moshê ensina ao povo o segundo parágrafo do Shemah, que enfatiza a doutrina fundamental de recompensa e punição, baseada em nosso cumprimento das mitsvot.

Esta Porção da Torá conclui com a promessa de D’us, uma vez mais, de que Ele protegerá o povo judeu se eles cumprirem as Leis da Torah.

Deuteronômio 7:12-11:25

Parasshah Vaet'chanan

 Vaetchanan, a parashá desta semana, contem o Shemá, uma das afirmações fundamentais da Torá:

“Shemá Israel Adonai Eloheinu Adonai Echad”

 

“Escuta Israel O Eterno é nosso Deus, o Eterno é Um.”

 

Tendo sido por séculos um os conceitos chave do povo judeu, o Shemá tem a ressonância e um poder sem comparação com nenhuma outra máxima do judaísmo. Livros e comentários foram escritos sobre ela, um incontável número de crianças judias aprendeu o Shemá como sua primeira oração, incontável número de judeus morreram com o Shemá em seus lábios.

 

No entanto o significado sutil das seis palavras do Shemá tem mudado com o passar do tempo.  De início, quando os israelitas viviam entre civilizações pagãs, a máxima deve ter sido entendida como “Escute oh Israel, Adonai é nosso Deus, somente Adonai”. Em outras palavras, entre todo os deuses adorados pelos povos em volta, somente Adonai é nosso Deus. Tempo virá quando o Deus bíblico será entendido como o único Deus.

 

Uma outra linha de pensamento que tem ressurgido com grande popularidade nos últimos anos enfoca os diferentes aspectos da divindade implicado nas palavras Adonai (YHWH) e Elohim (Deus). Enquanto a palavra Elohim se refere à manifestação atemporal e cíclica da divindade no universo natural, Adonai refere-se à idéia judaica de um Deus transformador, o Deus que faz diferença, que liberta da escravidão e que trás a cura e a criatividade. Segundo o rabino Harold Schuweis, “a divindade inclui ambos, o principio de realidade, Elohim e o principio de identidade, Adonai. Um deles, Adonai, a fonte da cura, e o outro, Elohim, é a vida do universo”.

 

Segundo o Shemá ambos esses aspectos estão unidos na divindade. Adonai e Elohim são um e o mesmo Deus. Esta é certamente uma noção radical. Que máxima profunda sobre o universo e a realidade o Shemá torna-se quando pensado desse modo. Sim para a realidade e sim para a transformação. Sim para a natureza, incluindo aí a natureza humana, e sim para a possibilidade de cura e superação dessa natureza. A afirmação da permanência e da constante mudança. Ehye asher Ehye Deus ele mesmo afirmou em outra parte da Torá que ele também pode ser denominado: “Eu serei aquilo que Eu me tornar.

 

Como será poderíamos entender o mistério da unidade Divina contido no Shemá? A resposta vem imediatamente após recitarmos o Shemá: através do amor. Vê achavta et Adonai Eloheicha, você deve amar o eterno teu Deus”.

 

Shabat Shalom,

 

Rabino Alexandre Leone                  

Deuteronômio 3:23-7:11

Parashah Devarim

O quinto e último livro da Torá, Devarim (Deuteronômio), lemos nesta semana. Começamos  o livro que é conhecido na literatura rabínica como Mishnê Torá, a revisão da Torá. Segundo a tradição, seu conteúdo foi falado por Moshê ao povo judeu durante as cinco semanas finais de sua vida, enquanto o povo se preparava para entrar em eretz Israel (Terra de Israel). Nele, Moshê explica e comenta muitas das mitsvot outorgadas previamente e outras que aqui aparecem pela primeira vez. Ele também os adverte continuamente a permanecer diligentes e fiéis às leis e ensinamentos de D’us.

A Parashat Devarim começa com a velada censura de Moshê, na qual faz referência aos numerosos pecados e rebeliões dos quarenta anos anteriores. Prossegue então relatando vários dos incidentes mais significativos que ocorreram com o povo judeu no deserto, lançando uma luz sobre as narrativas prévias da Torah.

Moshê fala do evento dos espiões, os dez dos doze homens enviados para vigiar a terra tinham voltado com um relatório negativo, e devido à falta de confiança dos hebreus, D’us condenou toda a nação a vagar por quarenta anos no deserto, tempo durante o qual a geração do êxodo morreu. Moshê então avança para discutir a conquista dos Filhos de Israel da margem leste do Rio Jordão. A Porção da Torah conclui com palavras de encorajamento para o sucessor de Moshê, Yehoshua.

Levanto para o lado humanista, quantas vezes ao final de uma prédica nós afirmamos: "Puxa, foi uma boa palestra, um bom estudo. Pretendo aproveitar estas lições em minha vida." às vezes aprendemos algo em uma aula que realmente nos inspira. Quantas vezes lemos um artigo sobre as lições da Torah pensando como ele é esclarecedor? Porém, apenas um dia depois, as lições e inspirações são esquecidas. Voltamos aos nossos empregos e rotinas diárias e simplesmente apagamos aquilo que aprendemos um dia antes. Revisar o aprendizado é algo que devemos fazer sempre, assim como ensina a tradição, que Moshê revisou a Torah, nós também devemos rever os nossos estudos sempre. Um judeu é alguém que se identifica com a história, cultura, e o futuro do povo judeu, a liberdade e dignidade do povo judeu deve ir de mãos dadas com a liberdade e a dignidade de cada ser humano.

Luciano Lopes Casalunga

Deuteronômio 1:1-3:22

Entre os diversos assuntos tratados na parashá Matot, estudamos aquelas relativas à terra de Canaã. Inicialmente a Torá nos conta que duas tribos preferiram não se estabelecer na Terra Prometida, os descendentes de Reuven e de Gad. Isso porque tinham muito gado e as planícies de Moav - que na época não eram o deserto de hoje - eram lugares de excelentes pastagens.

 

Ao saber das intenções dessas tribos, Moshê se enraivece e relembra o episódio dos doze espiões. Naquela ocasião o povo hebreu também se recusou a entrar em Canaã, e D'us percebeu que eles ainda precisavam amadurecer como nação, tendo determinado que caminhassem 40 anos pelo deserto, até uma nova geração se tornar adulta.

 

Os descendentes de Reuven e Gad então fazem uma segunda proposta: seus homens entrariam em Canaã para ajudar na conquista da terra, mas suas famílias e gado ficariam nas terras conquistadas dos edomitas, onde se estabeleceriam. Moshê aceita essa idéia e, considerando o grande território que haviam conquistado nas batalhas que lemos nas parashiot anteriores, ainda determina que metade da tribo de Menashe também fique a leste do Rio Jordão. Menashe também se compromete a enviar seus homens para ajudar nas guerras que seriam travadas dentro de Canaã.

Rabino Alexandre Leone

Bamidbar - Números 30:2 - 32:42

Parashah Pinchas

Ao final da parashah da semana anterior, aprendemos sobre as mulheres medianitas que se utilizam da sedução provocando os homens judeus e os levando a adorar Ba'al Peor, um abominável ídolo pagão. A estratégia para seduzir os homens surtiu efeito e já provocara a morte de 24.000 pessoas por uma peste que os sábios consideram ser enviada pelo próprio D'us. A história tem seu clímax quando Zimri, um príncipe da tribo de Shimeon, é flagrado tendo relações sexuais com Kazbi, uma princesa Medianita, bem no meio do acampamento israelita. Pinchas, o neto de Aharon, reage tomando de uma lança e golpeando os dois parceiros pecadores, e por causa disso se põe um fim à praga.

E assim iniciamos a porção desta semana da Torá, que recebe o nome de Pinchas por seu ato destemido. Aqui lemos sobre a recompensa de D'us a Pinchas, que foi uma bênção de paz e eterno sacerdócio. Estranhamente, embora esta discussão ocupe apenas parte de uma curta seção da parashah da Torah, mesmo assim a porção inteira recebe o nome de Pinchas. Não somente isso, se a porção da Torah tem de receber o nome de uma pessoa, aparentemente faz mais sentido incluir todo o episódio de Pinchas, de seu ato heróico até a recompensa de D'us, tudo em uma porção. Por que seu ato corajoso foi discutido na semana passada na Parashá Balac e sua recompensa descrita esta semana na Parashah Pinechas?

Talvez, a divisão da Torah do episódio em duas porções seja uma tentativa de ensinar-nos uma lição. Pinchas matou Zimri por uma razão e apenas por uma razão, ele sabia que era a coisa certa a fazer. Alguém tinha que tomar uma atitude e impedir que as mulheres medianitas causassem a morte de toda a nação judaica. A ação de Pinchas foi motivada no mais alto nível. Pinchas não agiu por auto-gratificação. Não o fez porque desejava que uma Porção da Torah recebesse seu nome. Ele o fez apenas pela santificação do nome de D'us e Seu povo. Ao separar a ação de Pinchas de sua recompensa, a Torah está nos ensinando que Pinechas não previu, ou mesmo se preocupou, em receber uma recompensa de D'us. Sua ação foi realizada por si, por seu próprio mérito.

Quantas vezes achamo-nos fazendo algo não porque é a coisa certa a se fazer, mas porque desejamos receber algum tipo de recompensa? Quantas vezes fazemos algo apenas para destacar nosso ego? O que a Torah está nos ensinando através de Pinchas é que devemos tentar fazer as coisas com mais empenho e simplesmente porque sabemos que isso é o certo. Nossa recompensa virá na hora certa. Não devemos fazer boas ações apenas para ver nosso nome brilhar.

Luciano L. Casalunga

Parashah Balak

Parashá Balak pausa um pouco as viagens do povo judeu no deserto a fim de relatar certa história do profeta Bilam, um pagão que tenta amaldiçoar os Bnei Israel, mas acaba por proferir uma benção.

Contratado pelo rei Balak, que dá o nome a esta parashah, rei de Moav, o profeta Bilam concorda em ir para uma jornada até o acampamento israelita. Mas mesmo sendo um profeta pagão ele primeiro pede permissão a D'us, e vai com a condição de que falaria apenas aquilo que D'us colocasse em sua boca.

Durante a viagem, no relato da Torah, aparece certo anjo com uma espada e bloqueia o caminho de Bilam, fazendo com que a mula que estava montado se desvie repetidas vezes do caminho. O tal profeta era Incapaz de ver o anjo, Bilam reage batendo no animal que ele considera desobediente, isso ocorre por três vezes. O relato do texto bíbico tras a informação em que milagrosamente, D'us faz com que a tal mula, sua montaria, converse com o profeta Bilam, e D'us revela aos olhos do profeta, para que possa ver o anjo de pé em seu caminho. O anjo então lembra a Bilam uma vez mais que ele pode apenas falar as palavras que o Criador colocar em sua boca. Essas bençãos são hoje recitadas ao adentrar em uma sinagoga.

Chegando próximo do acampamento hebreu, Bilam começa sua tarefa em amaldiçoá-los repetidamente, porém todas as vezes D'us interfere, e em vez de maldições ele termina por pronunciar várias bênçãos e preces.

A Porção da Torá termina com a libertina idolatria dos homens hebreus com as filhas promíscuas de Moav e Midian, e o indecente ato público de Zimri, um príncipe da Tribo de Shimon, com uma princesa midianita. Pinchas, neto de Aharon, reage zelosamente furando-os até a morte com uma lança, detendo uma peste que D'us havia feito irromper no acampamento.

Luciano Casalunga 

Números 22:2-25:9

Parashat Chucat

Parashat Chucat

Chucat começa com o puro decreto da Torá, Chucat Hatorá, uma mitsvá que somos conclamados a cumprir mesmo que não possamos entender seu propósito e sua razão - a vaca vermelha (Pará Adumá), cujas cinzas eram usadas para purificar as pessoas que se contaminaram através de contato com o corpo de uma pessoa morta.

A narrativa então salta 38 anos, para iniciar a descrição do que aparece imediatamente antes do povo judeu entrar na Terra de Israel. A profetisa Miriam morre, e o povo fica sem água, pois o miraculoso poço que os acompanhara durante sua jornada no deserto existia apenas pelo seu mérito.

D'us ordena a Moshê e a Aharon que falem com uma rocha em especial, que produzirá água instantaneamente; em vez disso, Moshê golpeia a pedra com seu cajado, e D'us diz aos dois líderes que eles não entrarão na Terra Prometida.

Depois, o rei de Edom recusa-se a deixar o povo judeu passar, fazendo-lhes tomar uma rota mais distante. Aharon morre e é sepultado no Monte Hor, e seu filho Elazar o sucede como Sumo Sacerdote.

Os Filhos de Israel cantam uma canção de louvor sobre o milagroso poço que D'us tinha feito surgir pelo mérito de Miriam, e a porção termina com as batalhas e vitórias sobre Sichon, o rei de Emori, e Og, o rei de Bashan.

As Três Categorias de Mitsvot

As mitsvot da Torá, geralmente, pertencem a uma de três categorias:

Mishpatim - Leis Civis: "Mishpatim" são leis Divinas que promulgam a segurança e sobrevivência da sociedade humana. Incluem, por exemplo, a proibição de roubar e matar.

Edut - Testemunhos: Se uma mitsvá testemunha um evento histórico ou algum aspecto de nossa fé, é chamada de "Edut", testemunho. São exemplos a mitsvá de observar o Shabat, que atesta nossa crença de que o Todo Poderoso criou o mundo em seis dias; observar as Festas (Yom Tov), pois comemoram o Êxodo do Egito; as mitsvot de tsitsit e tefilin que demonstram nossa crença na soberania de D'us.

Chukim - Decretos Divinos: Na categoria de chok (plural: chukim) classifica-se todas as mitsvot cujo propósito ou significado não são compreendidos pela inteligência humana.

Esta categoria de mandamentos é a mais difícil de respeitar. O Talmud nos diz que essas são as leis que "a má inclinação (yêtser hará) e as nações do mundo tentam contestar." Se não compreendemos o motivo de alguma coisa é tentador achar pretextos para não faze-la. Quando tentamos explicar nossa religião aos não-judeus, as leis que não tem um motivo óbvio são as mais difíceis de compreensão. O fato de um mandamento não ter um motivo óbvio torna seu cumprimento um ato de fé, muito mais ainda. Ele indica que estamos prontos e desejosos de obedecer às ordens de D'us, até mesmo quando não podemos justificá-las racionalmente.

Todas as leis de pureza e impureza ritual pertencem à essa categoria de mandamentos conhecidos como chukim, decretos. Portanto, disseram nossos sábios, "O corpo morto não impurifica, e a água não purifica. Mas sim, disse D'us, Eu dei uma ordem, e emiti um decreto - e você não tem permissão para questioná-lo."

Demonstramos assim, que estamos colocando D'us acima de nosso próprio intelecto. Apesar de talvez não sermos capazes de justificar esses mandamentos perante o mundo, expressamos nossa segurança interior como judeus ao continuar cumprindo-os.

Há numerosos exemplos de chukim, mas o Midrash enumera quatro sobre os quais a Torá afirma explicitamente: "Este é um chok." Uma vez que contém elementos aparentemente contraditórios, são passíveis de serem ridicularizados pelos que se pautam pelo pensamento racional. Por isso, a Torá aconselha o judeu a dizer a si mesmo: "É um chok, não tenho direito de questioná-lo."

Os quatro chukim são:

1. Yibum: Um judeu que se casa com a esposa de seu irmão enquanto este ainda está vivo, ou mesmo após sua morte, incorre em pena de caret (morte espiritual), contanto que seu irmão tenha tido filhos. Porém, se a esposa do irmão não tem filhos, é mitsvá casar-se com ela (levirato, yibum).

Sendo que a lógica acha muito difícil aceitar este paradoxo, o versículo enfatiza: "E vocês guardarão Meus chukim." (Vayicrá 18:26).

2. Shaatnez: A Torá proíbe vestir-se com roupas que contenham mistura de lã com linho. Não obstante, é permitido vestir um traje de linho em cujos cantos haja tsitsit de lã atados. Por mais que questionemos esta exceção, a Torá declara, no que concerne à mitsvá de shaatnez: "E vocês guardarão Meus chukim." (Vayicrá 19:19).

3. O bode para Azazel: Um bode era enviado à morte como parte do Serviço de Yom Kipur, purificando o povo judeu de seus pecados. Ao mesmo tempo, impurificava o agente que o enviava. Por conseguinte, esta lei é chamada de "um chok eterno" (Vayicrá 16:29).

4. A vaca vermelha: As cinzas da vaca vermelha purificavam um judeu que encontra-se impuro, enquanto tornavam impuro qualquer um que estivesse envolvido em sua preparação. Uma vez que isto também desafia a lógica, a Torá introduz o assunto com as palavras: "Este é o chok da Torá" (19:2); devemos aceitar a mitsvá como uma ordem Divina.

Os chukim, contudo, não são "leis sem razão"; sua lógica, porém, é Divina. Os maiores dentre nosso povo foram capazes de compreender algumas delas.

Assim, o fundamento racional por trás das leis da vaca vermelha foram reveladas de maneira Divina a Moshê.

Luciano Casalunga

Números 19:1-22:1

Parashat Côrach

"Os líderes da rebelião ficaram perante Moshê com duzentos e cinqüenta homens dos Filhos de Israel, líderes da congregação, aqueles convocados para a reunião, varões de renome" - Bamidbar 16:2.

Vamos imaginar que somos um dos duzentos e cinqüenta homens que estavam lutando pelos "direitos iguais" sob o comando de Côrach. Como estes homens eram líderes judeus, pode-se presumir que eram pessoas inteligentes; a maioria dos líderes da história o foi. Portanto, vamos imaginar no lugar deles. Côrach vem até nós e nos convida a juntar-se a uma rebelião contra Moshê e os Cohanim. Você provavelmente perguntaria: "Estamos lutando contra o quê?" A resposta seria: "Não é justo que os Cohanim sejam os únicos a realizar o serviço de D'us no Mishcan. Creio que todos deveriam ter permissão de participar."

Caso nós fôssemos um daqueles homens inteligentes, diriamos: "Côrach, você teve uma ideia brilhante, mas cremos que você deve rebelar-se sim e, se e quando você vencer, ficaremos felizes em realizar o serviço junto com os outros. Afinal, D'us disse que qualquer não-cohen que realize o serviço morrerá, portanto, por que deveríamos expor a tamanho risco?"

De forma notável, todos eles concordaram em participar da rebelião e realizar o serviço proibido, e todos morreram. O que levou pessoas tão inteligentes a fazer algo tão insensato?

Além disso, parece que a porção desta semana da Torah sai um pouco de seu rumo para enfatizar a importância daquelas pessoas que se rebelaram contra Mosheh. Se eles tivessem sido homens de reputação duvidosa, seria razoável a Torah nos dizer quem eram eles, num esforço para demonstrar que apenas os membros inferiores da nação ousavam rebelar-se. Entretanto, seria uma publicidade muito negativa para os judeus mencionarem eternamente que foram alguns de seus maiores líderes que pecaram. Por que a Torah passa ao mundo esta informação pejorativa sobre nossos ancestrais?

Para encontrar uma resposta à nossa pergunta, devemos primeiro entender a situação dos líderes do passado. Imagine que além de ter um altíssimo Q.I., você é extremamente rico. Após adquirir tudo aquilo que seu coração deseja, ainda lhe sobra uma soma respeitável. Você tem tudo que o dinheiro pode comprar, mas não tem nenhum poder verdadeiro, então adquire uma companhia influente. Você se sente no topo do mundo, até que um dia liga a televisão e lá está, algo que você não tem - a presidência.

O sentimento de inveja começa a roê-lo lentamente por dentro, e você se torna terrivelmente deprimido. Percebendo que você não está bem, um de seus melhores amigos sugere que você candidate-se a presidente. Uma grande ideia, você pensa, mas após alguns meses de campanha, percebe que embora você possa ter o dinheiro para comprar alguns votos, não os terá em número suficiente para elegê-lo, portanto é forçado a desistir.

É exatamente contra este cenário que a Torá está nos advertindo. Côrach e seu grupo tinham tudo que poderiam desejar - riqueza, honra, prestígio, tudo exceto o direito de participar no serviço do Templo. Isso estava reservado para os Cohanim, e ninguém podia comprar aquele cargo.

Os rabinos em Pirkê Avot (Ética dos Pais 4:28) ensinam que "inveja, desejo e honra removem uma pessoa deste mundo." Faz sentido que estes líderes sentissem inveja dos Cohanim. Imagine como deve ter sido difícil verem os Cohanim fazendo o serviço no Templo, enquanto eles tinham de estar longe da área sagrada.

"Sinto muito, mas nenhum não-Cohen pode passar deste ponto," o guarda sempre dizia. O desejo de fazer o trabalho do Cohen e ter a honra reservada somente aos Cohanim certamente alimentou esta inveja. Assim, como o infeliz candidato à presidência, os seguidores de Côrach também tentaram conseguir o inatingível.

Agora podemos avaliar por que eles agiram, mas ainda não sabemos o que motivou pessoas tão inteligentes a ignorarem a verdade óbvia, que podiam estar jogando fora suas vidas, aparentemente sem muita reflexão. Talvez estes homens estivessem cegos. Não a perda física da visão, mas sim uma involuntária cegueira auto infligida. Muitas coisas podem cegar uma pessoa, mas precisa ser algo muito forte, como por exemplo a inveja, para impedir uma pessoa de ao menos perceber que foi cegada. A inveja é muitas vezes comparada a uma chama que queima as entranhas de alguém. Como uma pequena chama, a inveja devora a pessoa e rapidamente cresce até um fogo furiosamente incontrolável. É claro que estes homens não eram tolos. Na verdade, alguns eram até brilhantes, mas estavam cegos.

Com esta ideia em mente, podemos entender por que a Torá sai um pouco de seu rumo para contar-nos como eles eram notáveis. A Torá deseja enfatizar que mesmo pessoas notáveis podem ficar cegas pelos seus desejos. A Torá está nos advertindo a todos, mesmo nossos maiores líderes, a não nos deixarmos enganar pensando que somos melhores que o grupo de Côrach, que sucumbiu ao pecado da inveja. Se eles puderam ignorar o óbvio, também nós podemos.

Então, o que podemos fazer para proteger-nos? O Talmud (Tratado Sanhedrin 109b) conta-nos uma história interessante sobre um dos rebelados de Côrach, On ben Pelet (mencionado no primeiro versículo da Porção da Torá) que havia planejado participar da rebelião com o restante dos líderes. Entretanto, sua sábia e justa mulher persuadiu-o a não participar, argumentando que mesmo que a rebelião fosse bem sucedida, Côrach seria aquele a dominar, e On permaneceria submisso a ele, assim como já era a Mosheh. Isso trouxe juízo a On, e com a ajuda da esposa, sua vida foi salva.

Como seres humanos, freqüentemente somos presas do dilema: "Onde estão meus óculos?" Quase sempre procuramos por eles desesperadamente sem achá-los, apenas para mais tarde descobrir que estavam o tempo todo em cima de nossa cabeça. Algo que leva a outra pessoa apenas uma fração de segundo para encontrar causa-nos tanto problema por tanto tempo. Poderia parecer que a maneira de nos proteger é ter outras pessoas que possam dizer-nos se nossas ideias são boas.

Procurar conselho antes de agir, trocar ideias com alguém mais, pedir conselhos. Ao interiorizar a lição que nos foi ensinada pelos notáveis, embora desafortunados, homens do grupo de Côrach, estaremos mais preparados para enfrentar os grandes desafios da vida, e poderemos até ter mais sorte procurando nossos "óculos" desaparecidos.

Luciano Casalunga

Números (Bamidbar) 16:1 - 18:32

Parashat Shelach

O caso trágico dos espiões é um dos mais frustrantes e intrigantes eventos dos registros da Torá. Frustrante, porque como observadores casuais, sentamos com nossas mãos atadas enquanto a história dolorosamente se desenvolve, trazendo com ela resultados tão desastrosos que as ondas de choque continuam a assombrar-nos até hoje. Intrigante, porque é quase inimaginável que uma nação que testemunhou coletivamente o poder do "braço" estendido de D'us quando ele os libertou do cativeiro do Egito pudesse questionar sua capacidade de colocá-los na Terra Prometida. Como justificamos sua perda de emunah (confiança) e qual a conseqüência que isso tem para nós hoje?

A parashah da Torah encerra-se com o mandamento de adornar todas as vestes de quatro cantos com os cordões de tsitsit. Rabi Mordechai Gifter faz uma fascinante observação sobre a descrição da Torá explicando a função dos tsitsit. Somos ordenados a meditar sobre os tsitsit, que nos lembram do restante das mitsvot, para que não nos deixemos levar pelas paixões de nosso coração ou pelos desejos de nossos olhos (Bamidbar 15:39).

Rashi explica que o coração e os olhos necessitam proteção especial, pois são naturalmente inclinados a levar a pessoa ao pecado. O processo do pecado, continua Rashi, primeiro envolve os olhos percebendo um objeto de desejo. O coração então se inflama com uma ânsia pelo objeto, e juntos, o coração e os olhos impelem o corpo à ação.

Rabi Gifter pergunta: "Se a armadilha do pecado é primeiro armada pelos olhos e depois pelo coração, como afirma Rashi, por que então a Torah os escreve na ordem oposta, declarando que os tsitsit são uma prescrição contra seguir o coração e depois os olhos?"

De forma clássica, entendemos a posição hierárquica do homem como o último a ser criado, como sendo um símbolo do papel dominante que o gênero humano representa face a face com o universo. O palco está montado: todas as matérias primas estão em ordem, e o homem é jogado em cena para domar a força bruta, elevando-a quando a coloca a seu serviço. Entretanto, num sentido mais metafísico, talvez a colocação do homem seja para indicar que toda a criação em si não tem qualquer finalidade, é um estado totalmente incompleto até que o homem seja por fim criado.

Nós, seres humanos, somos peculiares. Já aconteceu de você comentar com alguém um evento ou experiência e, ao comparar suas impressões, descobrir que vocês dois têm interpretações completamente diferentes do fato? Você sentiu-se esclarecido, estimulado, e interessou-se completamente na ocasião, ao passo que seu amigo ficou "ligado" nas falhas dos detalhes e achou tudo aquilo trivial e desinteressante. A realidade é, de fato, bastante elástica. Toma a forma de seja qual for a interpretação que desejamos lhe dar. Nossa atitude e conceito próprio ditam a maneira pela qual nos relacionamos com os estímulos externos, e que tipo de valor ou significado lhes atribuímos.

Em um sentido mais alto, o Homem é um parceiro de D'us na criação porque cada um de nós, segundo nossa personalidade única e formação do caráter, "criamos" nosso próprio mundo no qual vivemos.

Rabi Gifter explica: "É verdade que os olhos são os primeiros a induzir a pessoa a pecar; entretanto, os olhos verão apenas aquilo que o coração quiser ver!" Tsitsit exige que façamos uma reflexão sobre nossos deveres do coração, que questionemos e desafiemos nossos valores, esclarecendo o modo de ver a nós mesmos. Colocar tsitsit nos ajuda a definirmo-nos, ao identificar a causa que abraçamos. Assim como o mensageiro do elegante hotel da cidade é identificado como pertencendo ao quadro de empregados (e de fato tem um grande senso de dignidade e honra) pelo uniforme e insígnia que veste, o tsitsit serve para marcar-nos como leais servos do Todo Poderoso Criador do universo. São vestes da realeza.

Falando por si mesmos, os espiões revelaram a decadência que precipitou este acontecimento desastroso. Em seu relatório para o povo, incluíram um gracejo auto-depreciativo que parecia um tanto desafinado com o tom e andamento de sua história. Em meio à descrição da Terra de Israel como um país cujo clima produz nações de proporções gigantescas, acrescentaram: "Éramos como gafanhotos a nossos próprios olhos e também aos olhos deles" (Bamidbar 13:33).

O fato de os habitantes considerarem os judeus insignificantes como insetos certamente provocou sentimentos de apreensão e pavor. Entretanto, e quanto a seus sentimentos de inferioridade? O que achavam que esta declaração conseguiria?

A resposta é clara: o povo judeu não perdeu a confiança (emunah) em D'us; perdeu a confiança em si mesmo! Perderam a saudável perspectiva correta sobre qual era seu verdadeiro valor, ou de quem eram realmente. Se tivessem compreendido o imenso amor que D'us lhes devotava, teriam acreditado ser beneficiários merecedores do mais precioso dos presentes, a Terra de Israel. Em vez de olhar para si mesmos como gigantes que sem esforço poderiam esmagar as tribos canaanitas, viram uma nação de miseráveis e desanimados gafanhotos, que não mereciam o amor que lhes era concedido.

A verdade é que D'us nos ama mais do que jamais saberemos. Como um pai compassivo, Ele nos deseja apenas o melhor. É nosso trabalho sermos Seus filhos; temos de acreditar apenas em nós mesmos e refletir sobre a nobre identidade da qual os tsitsit servem como um constante lembrete. Enquanto usarmos Seu "emblema real", orgulhosamente denominando-nos Seus filhos fiéis, então somos Seus filhos e Ele abrirá para nós Seu amor ilimitado.

O amor de D'us com certeza vem com cordões amarrados.

Luciano Casalunga

Parashat Behaalotechá

Esta parashá retira seu nome da palavra chave em Números 8:2, onde Aharon é ordenado a ascender a Menorá, o candelabro de sete braços que iluminava o Tabernáculo e depois o Templo. A porção narra em detalhes a cerimônia de dedicação do para os levitas. Aqui nós somos informados que eles começavam a servir no Templo com a idade de 25 anos. Ocorre que em Bamidbar é relatado que a idade mínima é 30 anos. Para resolver esta contradição, Rashi, o famoso comentarista medieval, afirma que aos 25 eles começavam a estudar as mitzvot relativas às oferendas e aos 30 eles começavam a servir no Templo.

Aqui temos também uma fonte bíblica para o princípio talmúdico de que um aluno que não fizer nenhum progresso após cinco anos de estudo nunca o fará (Chulim 24a). Para os rabinos no Talmud o progresso, no entanto, não era medido com notas ou com outros meios formais, mas com a capacidade de fazer perguntas. O aluno que faz muitas perguntas demonstra não apenas interesse em aprender cada vez mais, ele também mostra que está se aprofundando no que aprendeu, pois a pergunta já é um foram de elaboração do estudo.

Behalalotachá menciona a data em que Deus disse a Moshé que instruísse o povo sobre a observância de Pessach, a primeira lua nova do segundo ano após a saída do Egito (Números 9:1). O livro de Números, porém começa “no primeiro dia do segundo mês do segundo anos” (Números 1:1), um mês depois. Essa aparente contradição foi resolvida pelo princípio rabínico de que não existe ordem cronológica na Torá (Pessachim 6b). Este princípio geral é aplicado para resolver outros problemas com os quais os rabinos se depararam. Os primeiros rabinos eram muito criativos em seus modos de interpretação da Torá. Os caminhos da interpretação rabínica são às vezes tortuosos, mas é através deles que os sábios, de todas as gerações, atualizaram e humanizaram o texto bíblico. Desse modo, o livro milenar continua aberto e sempre vivo. O judaísmo não é uma tradição que vive sempre no passado com  um interpretação congelada da vida. O Rabino italiano David Prato, que foi rabino chefe de Roma nos anos cinqüenta, parafraseando o Talmud escreveu: “O que o bom senso não faz, o tempo irá fazer”.

A transmissão da tradição não deveria ser entendida como um passar de bastão numa corrida olímpica onde o bastão é sempre o mesmo do começo ao fim da corrida. Tradição é antes de tudo memória coletiva viva que em cada geração precisa ser atualizada para se manter vital e poder responder às questões de cada época. Um exemplo disto são as interpretações rabínicas do texto bíblico que sempre buscaram tornar o texto relevante apesar das dificuldades de harmonizar um texto milenar com a vida das pessoas. Hoje como na época talmúdica perseguimos o mesmo ideal.

 

Shabat Shalom e Hag Sameakh,

 

Rabino Alexandre Leone

Behaalotechá: Números 8:1 - 12:16

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